por que você veio aqui?

o grupo tinha umas dez pessoas. e cada um tinha de dizer por que estava ali. o que falávamos ali não devia sair daquela sala. por isso só vou escrever o que eu disse. era um curso de meditação, e havia principiantes e iniciados.
eu respondi que estava ali porque queria andar e fazer tudo mais devagar. queria me tornar uma pessoa mais lenta.
ninguém disse isso. cada um tinha um motivo, e me pareceu que cada um falou de coisas muito íntimas. sobre a minha intenção de mudar a velocidade, isso não me parece íntimo. nem profundo. ao contrário. me parece bem raso, como um pires.
o curso terminou já faz uns meses, e as oito ou nove aulas que tivemos mudaram a minha vida. já escrevi sobre isso, e tenho falado sobre isso à exaustão. na prática, tudo segue igual, mas eu enxergo tudo diferente.
e quando a gente começa a ter umas ideias diferentes das que tínhamos, parece que o universo se encarrega de nos mostrar outras coisas, e assim, como uma bola de neve que dizem que vai aumentando conforme vai rolando montanha abaixo, uma coisa nova vem com outra coisa nova. por coisa eu quero dizer percepções.
é difícil começar a escrever devagar. talvez seja por isso que tenho escrito pouco.
...
um dia nossos professores chegaram com uma sacola de plástico grande. dentro dela havia várias bolinhas, que eles despejaram no chão, e pediram que cada um de nós pegasse uma. a bolinha menor era uma branca de ping pong, e a maior eu não lembro, mas devia ser uma  de plástico daquelas que crianças muito pequenas, de 2 ou 3 anos, adoram.
a instrução seguinte era simples: cada um de nós tinha de segurar uma bolinha com uma mão. era preciso segurá-la com força, e virada pra baixo. por alguns segundos ficamos apertando a bola que tínhamos escolhido, para que não caísse. a segunda parte do exercício era parar de fazer força com a mão e deixar a bola cair.
o que era mais fácil?
claro que a resposta não vem na hora. pelo menos pra mim.
a ideia do exercício era mostrar como soltar a bolinha é fácil, e como prendê-la exige esforço. e, bingo!, como passamos a vida segurando bolinhas de todos os tamanhos, de todos os pesos, de todas as cores. ficamos exaustos, presos ao passado, mas seguimos segurando bolinhas de todos os tipos.
...
o livro fala sobre felicidade. assunto sobre o qual eu tinha certeza que tinha algum domínio. ah ah ah. adoro quando minhas certezas viram dúvidas ou simplesmente se desmancham no ar - ou na terra - e deixam de existir. mas diferentemente do meu conceito, o autor diz que a felicidade de um momento ou a felicidade proporcionada por uma coisa (um par de sapatos novos, um bom vinho, uma bela viagem) é como enxergar o céu através do buraco de uma agulha. a outra felicidade, sobre a qual ele se refere, é como enxergar o céu com os dois olhos abertos. e essa não depende de fatores externos, mas do que está dentro de você.
uia!, agora peguei pesado. estou numa fase sinistra da vida: as palavras saem da minha boca sem eu me dar conta. elas fazem sentido, mas vêm de algum lugar que eu não sei qual é.
bem. parece que estou mudando de assunto, mas penso que tudo isso tem a ver com a bolinha. e o nome do livro é "felicidade: a prática do bem-estar", e seu autor, matthieu ricard, um monge budista que escreve lindamente.



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