a vida aqui no interior

enquanto a minha filha urra e vai se preparando pra ir pra cama, e meu filho lê depois de ignorar as ordens de ir pra cama, penso no que vou escrever, sobre a minha vida na cidade do interior onde, dizem, moram mais de 20 milhões de pessoas.
são várias pequenas histórias que me fizeram ter certeza de que moro numa cidadezinha.
tem a horta. é assim que eu chamo a caixa de papelão com verduras que chega à minha casa toda segunda-feira. só vem coisa fresquinha, e com cheiro que só o que é plantado sem veneno tem.
tem os passarinhos. fui dia desses contar pras crianças que a gente percebia que a primavera estava perto por causa do canto enlouquecido dos passarinhos. expliquei que o macho canta pra chamar a atenção da fêmea. e a minha filha perguntou como eles namoravam. claro que eu nunca sei responder o que ela me pergunta.
tem as azeitonas. tínhamos de preparar parte de um almoço grego para 150 pessoas. e as azeitonas estavam dando trabalho: a mayra tinha ido ao supermercado, mas as azeitonas pretas e sem caroço (pedido da filho do grego que estava coordenando a pajelança) estavam feias e caríssimas. a mayra, tensa, pediu ajuda. eu, atolada até o pescoço de trabalho, achei uma delícia ter de sair de casa no meio da tarde para ir comprar pouco mais de 1kg das azeitonas que se encaixavam na descrição da grega. o mercado de pinheiros, um maravilhoso, singelo e saboroso centro de compras da cidadezinho onde moro, fica a poucas quadras de casa. e lá fui na banca do seu joão, o velhinho português que dorme durante parte do expediente, pegar um saco cheio de azeitonas pretas, sem caroço e saborosíssimas! gastei pouco, fiquei feliz da vida e ainda colaborei pra que a nossa salada grega, com queijo feta "perfeito", nas palavras da grega, ficasse fabulosa (o almoço todo foi sensacional, e eu respirei aliviada, suando, certa de que uma escola waldorf não é só uma escola, mas sim uma lição de vida, como deveria ser na verdade toda e qualquer escola).
tem a sacola que foi deixada na portaria. sim, aqui no prédio onde moro, na cidadezinha do interior, meus amigos e os nem tanto costumam me deixar coisas. no domingo foi a vez de uma sacola com uma garrafa de vinho do francis coppola e um saco de bombons lindt. fiquei olhando aquilo boquiaberta. num domingo à noite, quem deixaria aquilo na minha portaria? abro o cartão, e descubro que foi o caio. ele queria agradecer por eu ter escrito uma carta de recomendação pra universidade onde ele queria - e vai! - estudar. então aproveitou que a mãe dele estava voltando para o brasil e mandou a sacola preciosa.
e tem os almoços e jantares festivos. "você gosta de receber?", me perguntou a renata na segunda-feira de manhã, quando tomávamos café na cantina da escola, antes de pegar a estrada que nos leva da escola até a cidadezinha do interior onde moro. eu contava que tinha tido um domingo mui feliz. tinha cozinhado pra alguns amigos. e isso tinha enchido o meu coração de alegria. cada um trouxe o que queria, e no fim comemos e bebemos às gargalhadas. ou como disse o guto, "este ano eu ainda não tinha comido tanto". a frase não é ipsis literis, porque não escrevi na hora, e depois esqueço. mas foi isso. bruschetta de queijo brie com geleia de pimenta, umas berinjelas com curry e alecrim, uma tonelada de folhas com molho de mostarda e mel, risotto de linguiça com vinho tinto e horas depois risotto de funghi, bolo de chocolate com calda de brigadeiro, melão, café. ah, mas antes e depois de tudo, sangria, cerveja, coca-cola, água.
enquanto escrevo, um mosquito tenta se alimentar do meu pé. mas não consegue. aqui no interior, perto do rio, há muitos mosquitos. não gosto deles, e por isso tenho uma garrafa de álcool e cravo-da-índia que, quando aberta, faz com que eles voem pra bem longe. receita da vovó, coisa de cidadezinha mesmo.
por isso que gosto tanto de morar aqui. é gostoso, e é lindo.
ps - a segunda foto mostra as águas da lagoa da conceição, em floripa. não é bem perto de onde moro, mas não é tão longe também.





a vista da janela

os pés descansam e a alma também

Comentários

  1. Coisa mais linda esse texto, Tita!!! Uma verdadeira declaração de amor a essa cidade que adotamos e que nos adotou, tão grande e tão pequenininha! ADOREI!
    Bj,
    Dani

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    1. ieba! adoro teus comentários. vou atrás de um livro, pra juntar tudo isso que escrevo e que eu nunca leio.

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  2. leio e sempre sinto saudade... ainda mais saudade.

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    1. noossa, menina! há quanto tempo! que alegria saber que v lê meus escritos, mana.

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