mãe também é gente. bitte.


Era pra ser mais um dia das mães.  Eu sempre acho que essas datas são mais bestas do que legais, mas percebi que não é bem assim quando meu filho disse que ia passar o fim de semana na casa do pai dele, no Rio de Janeiro. Justo no dia das mães.
Mas como acho horrível forçar crianças a agradar adultos e suas expectativas restritas, egoístas e bestas, achei ok ele ir depois de perguntar várias vezes se ele tinha certeza de que queria passar o dia das mães com o pai dele e a madrasta.
Assim, estávamos só minha filha e eu em casa no fim de semana. Sabia que queria duas coisas no domingo: não cozinhar e ganhar presente! No caso de mães que não têm maridos, cabe às próprias providenciar seus desejos – uma vantagem, uma alegria, essa coisa de não ficar esperando ninguém fazer o que você gostaria que fosse feito! Então sábado cedo fui de bicicleta até um pastifício perto de casa para comprar massas frescas e molho para o almoço de domingo. E ainda ganhei um galho enorme e lindo de manjericão. A preparação para a comemoração do dia das mães estava sendo alegre e divertida.
À tarde eu tinha uma reunião com o meu filho. Fui sozinha, já que o cara tinha ido pro Rio na sexta. E minha filha pediu pra ficar em casa, já que ela não tinha nada a ver com a tal da reunião, onde pais e crianças amigas do irmão dela, e não dela, é que estariam por lá.
Lá fui eu de bicicleta. É quase um jogo que eu jogo comigo mesma – nos fins de semana, deixo o carro intocado na garagem, e só saio de bike ou a pé. Para longas distâncias, metrô. A reunião demorou um pouco mais do que eu tinha imaginado, e quando cheguei em casa, a tarde já acabava e o sol já tinha ido embora.
Cansada, disse pra minha filha: “podemos fazer três coisas agora. Jantar, não fazer nada ou ir até uma loja comprar os meus presentes.” Eu não estava com preguiça, eu estava m-o-r-r-e-n-d-o de preguiça. Ao ouvir minha pergunta, ela saltou do sofá onde tinha passado a tarde atirada e disse “vamos comprar os seus presentes”.  No plural, porque para dois filhos são necessários dois presentes. Ah ah ah. Um dia das mães super programado organizado bombado.
E lá fomos nós até a garagem do prédio pegar as bicicletas, testar os faróis, separar as chaves dos cadeados.  Capacetes na cabeça, lá fomos nós, no escuro (!!!), às compras. A Lívia ia gritando atrás de mim, na ciclovia, “nossa, como é legal andar de bicicleta à noite! Muito mais legal do que de dia! E tem um ventinho!”.
Chegamos em poucos minutos, e fomos procurar o estacionamento das bikes. Eu, na minha santa ignorância, achava que um dos shoppings mais metidos à besta da cidade cinza teria estacionamento na calçada, na entrada. Mas não. O estacionamento era nos fundos, na entrada do estacionamento de carros. E, para minha surpresa, um segurança anotava o nome e o RG do dono da bike estacionada e trancada naquele pequeno estacionamento.
Escabelada, com uma mochila nas costas onde carregava um capacete e levando outro capacete na mão, entramos naquele centro de compras perfumado e cheio de senhoras com laquê no cabelo, homens com calças bem cortadas e bem passadas, mulheres com cabelos alisados e muitas, muitas babás de branco carregando carrinhos com crianças ou crianças sem carrinho.
Eu sabia a loja onde queria ir. Então foi fácil. Experimentei umas cinco peças, gostei de duas, adorei um lenço caríssimo de seda feito na china e comprei uma calça e uma blusa. Sim, é pra presente. O simpático vendedor ainda assim colocou tudo numa sacola, e eu tive de repetir: sim, é pra presente.
Amarramos as duas sacolas com caixas no bagageiro da minha bike, o que inevitavelmente amassou as lindas embalagens, e pedalamos de volta pra casa. A guria em êxtase, e a guria que mora em mim também. Eu teria um dia das mães em grande estilo, com tudo o que eu desejava.
A vida tem sido muito boa. Ser mãe é maravilhoso, e nesses anos todos de single parenting (na língua inglesa há muitos e muitos termos que não existem e/ou soam ofensivos em português) eu não aprendi só a trocar fraldas e ficar sentada em deleite amamentando meus pequenos. Aprendi a ter vontade, a fazer com amor, a dizer que não dá pra fazer, a fazer diferente a cada dia. A cheirar – as crianças, as flores, os temperos, as bebidas -, a olhar com atenção, a escutar o que o outro diz e o que o outro não consegue dizer. Aprendi muito mais do que ensinei. Muito mais.
Aprendizados que vão muito além da ideia/prática/perrengue insano de criar filhos sozinha – o que foi um acidente de percurso, e não um plano meu – e do medo de tropeçar em pedras pontudas ou em homens insensíveis no caminho.
Só posso dizer obrigada. Ao Joãozinho e à Lilica, que me fazem uma pessoa melhor. Mesmo eu tendo que repetir trocentas vezes o mantra que criei assim que cheguei em casa do hospital carregando  meu piccolino: mãe também é gente. Bitte.

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