meu deus, como não reclamar?
um dia sem reclamar. 24 horas. ela disse que isso era impossível. eu disse então para ela tentar um turno. uma manhã, que fosse. não, não dava. uma hora? ela disse que não dava para ficar em reclamar.
umas semanas depois, meu professor dá uma lição de casa mais severa do que a que eu tinha dado para as minhas alunas. duas semanas sem reclamar. 14 vezes o desafio das 24 horas.
eu sou muito crente*. o que torna mais fácil seguir o que parece difícil. por acreditar, eu me jogo do trampolim SABENDO que vai ser bom para mim. não necessariamente agradável nem divertido, mas bom.
eu também sou bem humorada. não sempre, mas quase. então dei uma risada entusiasmada quando escutei meu professor dizendo "two weeks without complaining". ele também é uma pessoa bem humorada e deu risada ao falar da lição. ele sabe o quanto seus alunos se esgoelam pra dar conta de pôr em prática os ensinamentos sábios que atentamente escutamos, na esperança de que penetrem nas nossas células e dali nunca mais saiam nem adormeçam.
bem, o que eu tenho a dizer é que ficar sem reclamar é quase enlouquecedor. ah ah ah. eu me dei conta de que passo umas 28 horas reclamando a cada 24 horas. ah ah ah. claro que o mais divertido NÃO foi (ou melhor, NÃO ESTÁ SENDO) perceber meu perfil, o de um ser humano rebugento e chatíssimo. o mais divertido é perceber as reclamações, que eu acabo de descobrir que fazem parte do meu corpo, se preparando para atacar e sendo impedidas. é como ser alvo de amigos naqueles campos de paintball que faziam sucesso quando meu filho tinha uma idade que eu achava totalmente inadequada para brincar de dar tiros. você corre e se esconde ou se deita no chão e fica suado e exasperado fugindo dos tiros. e assim estou eu desviando da minha própria artilharia de declarações ranzinzas.
temos essa tendência maléfica de perceber as coisas horríveis em detrimento das coisas maravilhosas. então porque estou sem trabalho me sinto um lixo, em vez de sair para correr e passar uma hora e meia em meio às árvores. só porque não emagreci os 16 quilos a que tinha me proposto durante a quarentena, quando estava comendo por duas pessoas, me sinto uma pessoa incapaz-de-cumprir-metas-estabelecidas, em vez de me surpreender com ter conseguido ficar 30 dias comendo por MEIA pessoa e percebendo como um caldinho de verduras esquenta minha barriga - onde mora meu buraco existencial - e me deixa feliz. e saciada, em todos os sentidos.
o fato é que ficar DUAS semanas sem reclamar está me fazendo perceber que o tanto que eu gasto de energia em mimimi é muito, mas muito mais do que eu jamais imaginaria. o processo de soltar a borda da piscina e boiar leva anos. muitos anos. de acordar cedo, sentar na almofada e praticar. praticar não fazer nada. praticar perceber que estou viva. praticar agradecer. praticar sentir alegria.
será o fim da velha rebugenta de 97 anos que mora dentro de mim?
* que ou o que leva excessivamente a sério suas obrigações ou assuntos, mostrando para
com estes ou aquelas demasiado zelo, entusiasmo e posição acrítica; que ou o que é
crédulo, ingênuo.
umas semanas depois, meu professor dá uma lição de casa mais severa do que a que eu tinha dado para as minhas alunas. duas semanas sem reclamar. 14 vezes o desafio das 24 horas.
eu sou muito crente*. o que torna mais fácil seguir o que parece difícil. por acreditar, eu me jogo do trampolim SABENDO que vai ser bom para mim. não necessariamente agradável nem divertido, mas bom.
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| aprendendo a boiar em qualquer lugar |
eu também sou bem humorada. não sempre, mas quase. então dei uma risada entusiasmada quando escutei meu professor dizendo "two weeks without complaining". ele também é uma pessoa bem humorada e deu risada ao falar da lição. ele sabe o quanto seus alunos se esgoelam pra dar conta de pôr em prática os ensinamentos sábios que atentamente escutamos, na esperança de que penetrem nas nossas células e dali nunca mais saiam nem adormeçam.
bem, o que eu tenho a dizer é que ficar sem reclamar é quase enlouquecedor. ah ah ah. eu me dei conta de que passo umas 28 horas reclamando a cada 24 horas. ah ah ah. claro que o mais divertido NÃO foi (ou melhor, NÃO ESTÁ SENDO) perceber meu perfil, o de um ser humano rebugento e chatíssimo. o mais divertido é perceber as reclamações, que eu acabo de descobrir que fazem parte do meu corpo, se preparando para atacar e sendo impedidas. é como ser alvo de amigos naqueles campos de paintball que faziam sucesso quando meu filho tinha uma idade que eu achava totalmente inadequada para brincar de dar tiros. você corre e se esconde ou se deita no chão e fica suado e exasperado fugindo dos tiros. e assim estou eu desviando da minha própria artilharia de declarações ranzinzas.
temos essa tendência maléfica de perceber as coisas horríveis em detrimento das coisas maravilhosas. então porque estou sem trabalho me sinto um lixo, em vez de sair para correr e passar uma hora e meia em meio às árvores. só porque não emagreci os 16 quilos a que tinha me proposto durante a quarentena, quando estava comendo por duas pessoas, me sinto uma pessoa incapaz-de-cumprir-metas-estabelecidas, em vez de me surpreender com ter conseguido ficar 30 dias comendo por MEIA pessoa e percebendo como um caldinho de verduras esquenta minha barriga - onde mora meu buraco existencial - e me deixa feliz. e saciada, em todos os sentidos.
o fato é que ficar DUAS semanas sem reclamar está me fazendo perceber que o tanto que eu gasto de energia em mimimi é muito, mas muito mais do que eu jamais imaginaria. o processo de soltar a borda da piscina e boiar leva anos. muitos anos. de acordar cedo, sentar na almofada e praticar. praticar não fazer nada. praticar perceber que estou viva. praticar agradecer. praticar sentir alegria.
será o fim da velha rebugenta de 97 anos que mora dentro de mim?
* que ou o que leva excessivamente a sério suas obrigações ou assuntos, mostrando para
com estes ou aquelas demasiado zelo, entusiasmo e posição acrítica; que ou o que é
crédulo, ingênuo.
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