breve relato das férias da mãe
hoje, 14 dias atrás, meu filho entrou no táxi e foi para o aeroporto. era o começo das férias dele. e das minhas também. as férias da minha filha tinham começado umas horas antes - ela tinha viajado no dia anterior.
fiquei pensando no saldo das minhas férias, durante as quais não viajei, não comi fora de casa, o dinheiro que gastei foi só com a compra de comidas e bebidas e quase não saí de casa. do que eu me lembro, foi mais ou menos assim:
eu estava trabalhando no dia 18 de dezembro, e não me continha de felicidade. falava pra um e pra outro que as minhas férias já tinham começado. é uma coisa não usual a gente falar em férias quando se está no trabalho. talvez tenha um pouco a ver com a nossa necessidade de colocar tudo em caixas. tem a caixa do trabalho, a caixa das férias, a caixa do fim de semana, a caixa de ficar sério, a caixa de se divertir.
estou tentando tirar a minha vida das caixas. ou seria tirar eu mesma de dentro de caixas que eu inventei? boa pergunta. não sei a resposta.
fiquei 14 dias em casa, sozinha. e daí? quantas pessoas ficam sozinhas em casa? milhões. bilhões, talvez. mas eu sou mãe, então é raro eu estar sozinha na minha casa por mais do que algumas horas. assim como todas as mães do mundo, claro. eu não sou uma exceção.
zero ciclistas. sábado, 29, alto de pinheiros, sp |
fiquei pensando no saldo das minhas férias, durante as quais não viajei, não comi fora de casa, o dinheiro que gastei foi só com a compra de comidas e bebidas e quase não saí de casa. do que eu me lembro, foi mais ou menos assim:
- um trabalho frila pequeno, iniciado e concluído
- quatro dias deitada no sofá
com bolsa de água quente e uma dor violenta nas costas
- um passeio de bicicleta ao
parque
- duas picadas de formiga no
parque
- duas caminhadas - uma quando
a dor nas costas começou, e outra hoje, quando a dor está suave
- algumas refeições com a
mesmíssima comida por 3 ou 4 dias
- revisão do meu livro de
poemas e envio para a minha editora
- inúmeras horas de meditação
sentada e andando e cantando
- duas faxinas no apartamento
- três livros lidos
- muitos filmes bons assistidos
no sofá
- uma ida ao cinema
- um Natal na casa de amigos da
amiga
- um ano-novo sozinha em casa
chega. eu faço um esforço
hercúleo para me livrar de listas e ploft, lá vem uma nova listinha de novo. é
um vício, e parece que dá mais trabalho de largar dele do que nas vezes em que
rompi com os marlboros.
nesses dias, eu estive aflita por duas
vezes. uma quando a culpa chegou, um dia antes do natal, e eu passei mal. durou
o tempo suficiente até eu me dar conta de que eu estava em são paulo sozinha
porque meus filhos tinham declinado do convite de passar o natal em casa e
foram passar o natal com o vô deles. a outra vez foi ontem, último dia do ano.
eu temia achar estranho passar o ano-novo sozinha - quem nunca?, ah ah ah.
na verdade, a ideia de ficar
sozinha costuma ser aflitiva. temos medo. mas do quê mesmo? eu não tinha medo
de nada ontem, só um certo pavor sobrevoando a minha cabeça. é engraçado. a
nossa imaginação é tão vasta, que conseguimos imaginar que podemos ficar
surtados e começamos a passar mal com a ideia do surto que nem vem.
mas a parte boa é que, como acontece nas outras 364 noites do ano,
eu comecei a morrer de sono e fui dormir lá pelas dez. tinha cozinhado uma
lentilha que ficou maravilhosa. tinha salada, um espumante rosé. mas eu não
aguentei ficar acordada. fui dormir feliz e acordei mais feliz ainda. o pavor
que sobrevoava a minha cabeça tinha ido embora fazia muitas horas.
eu estava me sentindo um pouco
uma mulher psicopata que resolve passar o NATAL e o ANO-NOVO sozinha em casa.
mas bem pouco. aí eu me lembrava de como estava cansada, de como é importante
darmos atenção para nós mesmos. como é bom não escutar a palavra ôôôômãe por
uns dias, como fazia tempo, anos, talvez 47, que eu não ficava tanto tempo
sozinha. e o sentimento de que eu era uma psicopata ficava bem pequeno e sumia.
então eu falei com uma amiga. estava procurando companhia para passar um ano-novo tranquilo. esta
amiga me conta que está a mais de 1.000 km de são paulo. disse a ela das minhas férias, e
ela respondeu "que delícia ficar um pouco sozinha! acho que eu adoraria ficar
uns dias assim!" então a ficha caiu: eu estava sendo sã, 100% sã, quando
escolhi me refugiar na minha toca, usando as palavras de outra amiga, que não
queria fazer nada no ano-novo porque andou trabalhando demais e precisava ficar
só.
quanto mais cuidamos de nós mesmos, mais amigos que entendem e dão suporte às nossas escolhas surgem.
continuei minha procura. uma amiga está no sertão
baiano, outra está no interior de sp cuidando dos pais velhinhos. outra ia
pegar a estrada hoje muito cedo. outra já tinha combinado um jantar na casa de
um amigo. e assim eu concluí que ficaria em casa porque não queria ir a nenhuma
festa nem encontrar pessoas que gritam no ano-novo.
a ideia de que sou uma velhinha
de 92 anos num corpo de 47 se aproxima. ah ah ah. não, não sou. acordei hoje
muito lenta e descansada, e tive uma ideia maravilhosa. por que não acordar
todos os dias assim? como diz meu mestre, podemos escolher e ser quem
quisermos. mas ficamos enrolando tanto que esquecemos de tomar essas decisões (isso não é o que o meu professor diz, isso sou eu que digo).
2019 começa sem nenhuma lista de
resoluções. porque tudo o que eu queria eu já decidi ano passado! ah. uma lista a menos na minha vida.
pombas descansam na cerca da escola fernão dias, em pinheiros, sp |
passarinho na ponta do galho mais alto. como consegue? |
Comentários
Postar um comentário